tão antiga como Roma.
de quem é dono do mundo.
o significado de existir.
e nunca o iremos descobrir.

Saiu de casa e deu de caras com a porteira.
- Bom dia, senhora doutora.
- Bom dia, dona Etelvina.
«Digo que não digo, afinal de contas tens coragem ou não, se me meto num sarilho é que são elas, e depois quem acaba por pagar as favas sou eu.» Mas acabou por dizer.
- Dona Etelvina, então abriu a porta ao homem que veio contar a luz e deixou-me a casa num miséria?
- Numa miséria, senhora doutora? Mas o que foi que aconteceu?
- Quando cheguei ontem a casa o chão da entrada estava todo sujo, cheio de riscos, havia pegadas de lama pelos corredores e pela sala, e uma data de papéis revirados em cima da mesinha da sala es espalhados pelo chão. A senhora deixou o homem sozinho lá em casa?
- Pois, senhora doutora, o que aconteceu foi que o homem trazia os dois filhos com ele, são crianças, a senhora doutora sabe, e de repente chamaram-me do terceiro andar, que havia uma inundação, e eu tive que ir lá a correr.
- Mas, dona Etelvina, a senhora deixou-me o homem sozinho lá em casa? Dentro da minha casa? E ainda por cima com crianças?
Dava para desconfiar. Sabia perfeitamente que a porteira alimentava um odiozinho de estimação por si desde que se queixara numa reunião de condomínio de que a mulher deixava o lixo todo do seu patamar amontoado mesmo ao pé da porta da sua casa, e não tinha sido apenas uma vez, não senhora, era sistemático, o montinho ficava lá durante horas seguidas, e ela no parlapié com a porteira do prédio ao lado, diz que diz, diz que não diz, no dia seguinte ainda lá estava o lixo todo, tinha que saltar por cima daquilo para entrar e sair de casa e apanhar o elevador, até parecia que o armazém do lixo do prédio era ali mesmo à porta de sua casa.
E como deu por pegadas de cão entre as pegadas de gente no seu corredor, entendeu que o raio da mulher devia era mesmo ter metido os dois cães lá em casa quando abriu a porta ao homem da electricidade, se calhar andava mas era a passeá-los, aquelas duas feras irritantes que ladravam a todos os moradores do prédio e que lhe ferravam os dentes nos pés, uma vez até lhe tinham estragado um par de botas novas que lhe tinham custado os olhos da cara, e agora vinha com aquela dos filhos do contador da luz. Resolveu voltar à carga.
- Mas a senhora não estava lá quando o homem saiu?
- Ai, não, senhora doutora, estava lá no terceiro a ajudar a senhora dona Francisca com a inundação e depois ainda tive que telefonar para a Câmara, lá para os serviços da água, que era para virem cá, que havia uma fuga no contador e os canalizadores não mexem ali porque sabem que lá os da Câmara não gostam.
- Isso quer dizer que a senhora deixou o homem lá dentro de minha casa, com a porta aberta, e nem viu se ele a fechou ou não.
- Já disse à senhora doutora que não podia. Estava numa emergência.
- Pois. E deixar a porta da minha casa aberta não era uma emergência... Com gente lá dentro e sabe-se lá se eram ladrões ou não.
- Ladrões, senhora doutora? Pois então o homem da luz ia lá roubar?... O homem é de confiança, senhora doutora.
- De confiança? Então o homem mete-me gente lá em casa, deixa-me tudo virado do avesso e é de confiança?
- Eu acho que é, senhora doutora. Mas não sabia que ele vinha com os filhos...
- E os filhos traziam patinhas de cão, não é, dona Etelvina?
- Não percebi, senhora doutora. – A porteira corava, mas lá dar parte de fraca é que ela não dava. E com aquela doutorazeca muito menos. Qual doutora qual carapuça. Lá porque era a dona do Conservatório... A doutora Conservadora... Que fosse conservar latas de conserva para o supermercado, mas era...
- É. Havia marcas de patas de cães pela casa inteira. E a senhora sabe que eu não gosto de cães. Nem de gatos, nem periquitos, nem bichos de espécie alguma.
- Lá isso não sei, senhora doutora. Que o homem trazia os filhos, trazia. Cães é que não vi.
- Mas havia marcas de cães, dona Etelvina. E cheias de lama. Acho que ainda me fizeram um xixi na planta da sala. E os papéis que tinha por cima da mesa e que estavam espalhados pelo chão tinham pegadas de cães e marcas de dentes. Ainda me rasgaram uns documentos importantes que lá estavam e que nem eram meus. O que é que eu vou dizer às pessoas quando lhes devolver os documentos, dona Etelvina? Que uma matilha de lobos invadiu a Conservatória?
- Ai, Jesus, Credo, senhora doutora – E persignou-se. – Agora andam lobos aí à solta?
- Pelos vistos andam, dona Etelvina. E moram aqui no rés-do-chão.
- Nosso Senhor nos livre. A senhora doutora acha que os meus meninos agora são como esses bichos esfaimados que andam pelos montes, lá como na minha terra?
- Achar, achar, não acho, dona Etelvina. Mas que os lobos esfaimados que andam aqui pelo rés-do-chão me entraram lá em casa e me ferraram o dente nos papéis e me riscaram o chão todo, isso é que eu acho. Isto para além de encherem de porcaria os passeios aqui à volta do prédio.
- Ó senhora doutora, aquelas alminhas abençoadas não fazem mal a ninguém. Eu levo-os à rua de manhã e à tardinha e eles fazem as suas necessidades lá no jardim, não fazem nada aqui no passeio.
- Pois não, claro que não. Tenho mesmo a impressão que os montes de porcaria que andam ali espalhados devem ter sido deixados ali pelos filhos do senhor da electricidade.
- Lá está a doutora a desconversar. Pois se eu lhe disse que os rapazinhos só hoje é que vieram com o pai. E ele não vem todos os dias, não senhora, nem sequer todos os meses. É lá de tempos a tempos.
- Mas se calhar não têm casa de banho em casa e vêm fazer as necessidades aqui nos passeios, não é, dona Etelvina? Quando o pai os manda à casa de banho aí vêm eles que nem umas setas direitinhos aqui aos passeios.
- A senhora doutora gosta muito de brincar. – Ria-se ela a bandeiras despregadas, e todo o corpo abanava desde o pescoço até aos tornozelos inchados. – Nem sei quando é que está a falar a sério ou a brincar.
- A brincar, a brincar foi que me estragaram os documentos. E já nem me importava com a lama e os riscos se não fossem as dentadas e o lixo todo nos papéis. Que acha que eu faça agora, dona Etelvina? Que mande os papéis para o tribunal naquele bonito estado?
- Para o tribunal, senhora doutora? A senhora vai-me pôr os meus cãezinhos no tribunal?
- Não era isso que eu estava a dizer, mas já agora que me fala nisso, até que se calhar nem era má ideia.
- A senhora doutora nem me diga isso nem a brincar. Nosso Senhor nos acuda!
- E quem me acode a mim, dona Etelvina? Quer que eu vá dizer ao juiz que afinal aquelas marcas e os rasgões nos papéis foram porque tivemos um empregado na Conservatória que ficou com raiva de repente e desatou a morder na papelada e a atirá-la para o chão?
- Ai, senhora doutora, no tribunal é que não...
- Pois é, dona Etelvina. E o que é que eu digo agora?
- A senhora doutora podia inventar uma história. Dizia que tinha sido uma cliente sua que tinha levado um cãozinho quando ia fazer uma escritura e que o coitadinho tinha ficado à solta e se tinha metido com os papéis quando ninguém estava a reparar.
- Pois, estávamos todos a olhar para o lado. Se calhar ia a passar uma parada da GNR...
- Lá está a doutora a desconversar outra vez...
- Pois é, dona Etelvina, lá conversa tem a senhora.
- Eu, senhora doutora? Eu que sou tão calminha e que passo aqui dias e dias que quase não falo com ninguém.
- Pois. A não ser com a porteira ali do lado, com a senhora do primeiro, do segundo, do terceiro e por aí acima. Isto para já não falar do padeiro, do homem da distribuição do correio...
- Ai, a senhora doutora a dar-lhe. Eu tenho dias que só falo com os meus cãezinhos, coitadinhos, que não têm ninguém que fale com eles se não for eu...
- Coitadinhos dos bichos. Veja lá se morrem de indigestão por causa dos papéis de minha casa.
- Por acaso o Faneco até que hoje estava mal disposto, senhora doutora.
- Imagino. Ia-lhe dando um fanico.
- Ah, ah, a senhora doutora é mesmo uma brincalhona.
- Bem, havemos de falar disto outra vez, dona Etelvina. Agora estou com pressa.
- Até logo, senhora doutora.
- Até logo, pois claro. - E mal meteu o pé fora do prédio enfiou as botas em duas belas amostras de dejectos que simetricamente ornamentavam a entrada.
segunda-feira, dezembro 20, 2004
Segunda-feira de manhã
Hoje levantei-me cedo. Era ainda de noite. Apanhei com o sol matutino de chofre, coisa a que já não estava habituado, que nisto dos dias normais já o sol vai alto quando saio da cama, e aos fins de semana a maior parte das vezes já está quase noite quando meto o nariz fora de porta. Falando de Inverno, está bem de ver.
Mas quando uma pessoa se levanta cedinho parece que o mundo acordou todo ao mesmo tempo e que toda a gente está cheia de pressa de chegar a algum lado, muito embora tenha sérias dúvidas se as pessoas realmente chegam a algum lado ou se andam com a impressão de que chegam a algum lado todos os dias.
Não sei bem porque é que as pessoas se levantam de manhã cedinho para ir para esse sítio onde andam de cara grande o dia inteiro, e depois vão almoçar num pulo e voltam noutro para o mesmo sítio onde a cara grande aumenta ainda mais até quase rebentar quando chegam a casa, já de noite, e despedem as crianças para a cama com um beijo ainda mais apressado do que o almoço. Será que os dias fazem sentido nesse tempo todo que se gasta a andar para trás e para a frente, a fazer de conta que há alguma coisa de importante no vai-e-vem em que se faz de conta que se vai vivendo?
Hoje levantei-me cedo. Era ainda de noite. Apanhei com o sol matutino de chofre e não gostei. Não gostei das caras que vi pelas ruas, a fingir sorrisos que não tinham, dos carros todos alinhados à espera das luzes verdes que agora estavam vermelhas e não deixavam passar ninguém, dos lugares para estacionar que iam sumindo aos poucos e poucos, do barulho, do fumo, dos cheiros, e das caras, mais uma vez das caras. E pensar que este silêncio dura todos os dias, que esta morte vai chegando mais perto, um tudo-nada mais perto, de manhã até à noite.
domingo, dezembro 19, 2004
Domingo. Hoje choveu.
Qui pro quo
Quando falaram em atacar a banca, nunca imaginaram que houvesse quem os levasse a sério. O certo é que, pouco tempo depois de o assunto ter sido mencionado nos noticiários televisivos, a sede do partido ficou muda e queda depois dos telefonemas a agradecerem a ideia e, já agora, que estavam com a mão na massa - e isto devia ser literalmente entendido - a pedir mais esclarecimentos acerca do que estaria na lista para mais uns ataquezitos à sorrelfa, que isto de imaginação já era chão que deu uvas, e uma ajudinha vinha sempre a calhar.
Aquele dia tinha rendido cerca de dezoito milhões de euros, o que não era nada mau para uns assaltantes de meia-tigela, que tinham feito carreira com umas joalhariazinhas de bairro, nada de monta, o currículo tendia assim para o fraquito, daí que tudo o que surgisse era bem vindo, calhava que nem ginjas, e com os tais milhões já podiam especializar-se e comprar um equipamentozito melhor no estrangeiro.
Os do partido é que não contavam com aquilo, e muito menos com uma fugazita de informação, vinda decerto de gente mal intencionada, que um partido de esquerda que se preze também lá tem umas ovelhas ranhosas, ou pelo menos invejosas, acerca das tais de chamadas recebidas. No dia seguinte lá estava escarrapachado nos jornais que o partido tal e tal tinha recebido uns telefonemas assim e assado, e por pouco não tinham faltado também os ramos de flores e os chocolates, com ou sem nota de agradecimento.
Reuniu-se o comité central (ainda não está clara a razão da não existência também de comités à esquerda e à direita do tal central, muito embora tal possa parecer estranho a leigos), foi passada uma valente reprimenda aos sindicalistas desgraçados que abriram a boca para falar dos tais de ataques, apanharam uma valente multa nos vencimentos dos 20 meses que se iriam seguir, que os cofres do partido estavam um tanto ou quanto necessitados, e já se havia começado a pensar em despedir algum do pessoal de secretariado, o que era uma hecatombe numa organização cuja principal ocupação era aparecer nos noticiários precisamente a refilar contra os despedimentos.
Por fim lá caiu o secretário geral, homem de poucos sorrisos e alguma verve, quiçá um tanto ou quanto «demodé», expulsaram-se uns quantos recalcitrantes críticos, com direito a cerimónia solene de cartões rasgados e tudo, e tudo acabaria por voltar ao rame-rame do costume não fosse o facto de, cerca de três meses depois, alguém ter despejado no passeio à frente da sede do partido uma estátua de bronze com cerca de dois metros de altura em que, numa simbologia um tanto ou quanto a tender para o abstracto, figuravam os símbolos partidários e se lia «Em reconhecimento dos bancários agradecidos». Durante a noite lá conseguiram cobrir o estafermo e levá-lo dali para fora, ao que se crê com a ajuda de meia dúzia de funcionários camarários. Nunca se descobriu a origem de tal encomenda.
sexta-feira, dezembro 17, 2004
O procurador
A profissão que tinha escolhido, ou que o tinha escolhido a ele, era a de procurador. Não desses de leis e papel timbrado, escritório com placa dourada à porta, mas dos outros, mais raros e valiosos, que procuram as coisas que os outros perdem, ou que acham coisas que não deviam ser encontradas. Já lhe acontecera dar de caras com gente que preferia nem se lembrar de que tinha perdido o que tinha perdido, muitas vezes pela simples razão de que as coisas perdidas nem sempre são para serem achadas, até porque tantas e tantas vezes estas acabam por serem substituídas por outras coisas, e a memória das primeiras desaparece aos poucos e poucos, como o fumo que se esvai pelas chaminés de inverno.
Mas gostava mais que lhe chamassem achador. A sua actividade envolvia a procura de pequenos objectos, relíquias de família, retratos de gente perdida no tempo, móveis aos quais se tinha perdido o rasto, automóveis estacionados sabe lá Deus onde (ou desviados para o diabo que os carregasse), e ultimamente tinha dado conta que as pessoas preferiam que lhes achasse outras pessoas. Não era tarefa fácil. A sua experiência ganhara-a ao cabo de anos e anos de perdidos e achados num gabinete da maior empresa de transportes públicos da cidade. Numa fase posterior passara ao trabalho de campo, ao contacto directo com os locais onde as coisas se tinham perdido. Um dia reparou que havia muita gente que de facto dava importância ao achamento de coisas que tinham levado sumiço por este ou por aquele motivo, resolver reformar-se e dedicar-se a tempo inteiro à profissão mas por conta própria. Pespegou com quatro ou cinco anúncios nos jornais e parece que a coisa pegou, passou de boca em boca como a gripe, e ao fim de três anos já lhe tinham passado pelas mãos mais de quinhentos casos, de desespero maior ou menor, com uma taxa de sucesso na ordem dos setenta por cento, o que não era nada mau, se tivermos em consideração que há perder e perder, e a sua classificação destes perdimentos atingira um tal grau científico a ponto de conseguir um ficheiro com para cima de trezentas e tal situações distintas. Isto apenas no que dizia respeito a objectos. Já quanto a pessoas o cenário era outro: havia quem se perdesse, quem perdesse alguém, quem andasse perdido, quem se quisesse perder, quem quisesse dar-se por perdido, quem não se quisesse perder, quem pretendesse perder-se, quem não quisesse dar-se por perdido (ou por achado), ou mesmo quem tivesse pretensões a aparecer perdido, por esta ou por aquela razão. E ainda havia variações.
Chegaram a propor-lhe trabalhar por conta de uma grande empresa bancária, mas não foi na cantiga. Mas parece que esta e outras no mesmo género apresentavam um grande interesse neste negócio de encontrar gente que pelos vistos não queria ser achada.
Tinha clientes de todos os tipos e feitios: mulheres que procuravam maridos, maridos que procuravam mulheres, pais que queriam achar os filhos que tinham levado sumiço ou a quem a certa altura tinham dado sumiço, filhos que já não sabiam dos pais, irmãos ou irmãs desencontrados, parentes que procuravam outros parentes, e aqui as variações eram também numerosas, clientes velhos e novos, gordos e magros, bonitos e feios, ricos e pobres, de sexo definido ou indefinido, brancos, pretos, amarelos, e até às pintas, que foi o caso de uma senhora que lhe surgiu um dia cheia de aflição pela porta dentro cheia de bexigas loucas porque não sabia onde haviam ido parar os dois filhos do primeiro casamento do marido, se bem que neste caso teve sérias dúvidas se aquilo era mesmo para ser levado a sério ou não.
Certa vez conseguiu achar até um indivíduo que se tinha perdido mais vezes do que as que tinha sido achado. Era um fenómeno, o tipo. Ia pela rua, virava uma esquina e puf, era como se nunca tivesse existido neste mundo ou como se mundo nunca tivesse existido para ele, ou como se o mundo não quisesse saber dele para nada. Como não tinha parentes nem amigos, a coisa tornava-se fácil, mas depois dava consigo a pensar se afinal valia a pena estar perdido, que não, que não valia a pena coisa nenhuma, e lá fazia pela vida em ser encontrado, o que não era fácil de todo, já que era preciso lembrar-se de tudo e quanto mais se lembrava menos lhe apetecia fazê-lo. Mas o procurador lá ia à sua procura, e não desistia até dar com ele numa pensão esconsa - daquelas que anunciam para a rua que possuem águas correntes quentes e frias, se calhar têm quedas de água pelas escadas abaixo e geisers a jorrar nos quartos e o Instituto do Património é que nunca deu por nada -, a dormitar num caixote de papelão num vão de prédio, a bebericar num bar de má fama numa rua ainda mais mal afamada, em mil e uma situações que ao fim de tantos anos não lhe eram estranhas, careca que estava de procurar gente perdida ou esquecida de que queria ser achada.
Aos oitenta e três anos o procurador finou-se. Que se saiba, não houve quem o procurasse no funeral, e actualmente perdeu-se-lhe o rasto à campa. Afinal, quem mais procurou não quis ser encontrado. E agora também já não adianta.
quinta-feira, dezembro 16, 2004
Descanso


Ver e ouvir, por favor

quarta-feira, dezembro 15, 2004
Os dias cinzentos

Quando ela acordou e assomou à janela da varanda, o dia estava cinzento, como de costume. Já estava farta daquilo, mas também não conhecia muito melhor do que gente cinzenta, horas cinzentas, umas após outras, um dia a dia monótono como o de tantos outros, certamente. Ouvia queixas todos os dias, de todos os que viviam no seu mundo, aliás o único que lhe coubera em sorte, que nisto de sortes há quem tenha muita ou pouca, a maioria assim-assim. Mas a cara de pau que via naquela gente dava mesmo a ideia de que a felicidade devia andar um tanto arredia da sua vida. Não havia quem tivesse iniciativa, quem dissesse «Finalmente acabámos com a crise, a comida vai dar à farta para todos e não haverá quem mais passe fome nem cá em casa nem em lado nenhum, até parece que estamos na Europa dos tais vinte e não sei quantos, que já foram doze ou menos e agora a Europa inchou a já querem lá meter os parentes e os vizinhos», falavam mal deste e daquele, e este e aquele falavam mal dos outros e de quem quer que estivesse à mão de semear, e acabavam o dia tal como o haviam começado, com ar de poucos amigos, prontos para bater na mulher, no marido, nos filhos, no gato, no vizinho de baixo, de cima, da esquerda e da direita, no chefe e no subordinado, em mim, em todo o mundo e ninguém.
Passando por alto esta breve referência vicentina, e voltando à carga com as tons acinzentados, era cinzento o sorriso, cinzenta a roupa que levavam para a rua, cinzento o sorriso que traziam de volta, cinzenta a conversa ao serão, que tinha já começado cinzenta logo de manhã, enfim, com umas quantas variações de cinzento ao fim de semana. E se o raio do gato fazia alguma quem pagava as favas era eu, que estava ali mesmo a jeito, que não sabia tomar conta dele, que isto e aquilo, por isso quando ele chegava a casa eu escondia-me no quarto e lá ouvia a voz dizer «Mas onde raio é que ela está metida, querem ver que já fez alguma?», e se estava à espera de alguma festa que fosse tirando a cavalinho da chuva.Tola como sou, acabava por aparecer com a língua de fora, como se me tivesse esfalfado o dia inteiro, e então teria direito a uma festa, que isto de vida de cão tem que se lhe diga.
Ponta Delgada
Houve um dia um barco qualquer,
depois juntaram aqui e ali
umas pedras escuras
que foram uma cidade.
As ruas estreitas, iluminadas já neste século,
foram desenhadas por homens certos,
esquecidos das coisas práticas.
Sobre esta terra houve casas,
alguns nomes amaram em silêncio.
De noite, eram palavras antigas;
morreu-se devagar, a cantar pelas igrejas
outros pecados que alguém sabia serem os seus.
Sucessos
Antonino Formiga Coxinho, de alcunha o Mexicano, era finalmente Chefe de Gabinete de um Secretário de Estado. A alcunha vinha-lhe dos tempos da juventude, em que passava horas atrás de horas sentado na pastelaria do mesmo nome, saltando de mesa em mesa a cravar bicas a tudo quanto fosse gente conhecida. Às vezes tinha a sorte de lhe pagarem alguma coisinha melhor, quando alguma dama já entradota de vida solitária lhe fazia um discreto sinal para convidá-lo a fazer-lhe companhia. Claro que uma coisa levava a outra e Antonino dava por si na manhã seguinte a sair para uma rua assim-assim desconhecida a tresandar a perfume de velha. Um ou outro verão chegara até a passar férias em Paris, Genève ou Veneza graças ao estratagema. O pai era filho de um casal de rendeiros de Soure, e tivera uma infância difícil, trabalhando aos 10 anos como marçano para o tendeiro da terra; porém, e talvez devido a essas experiências de mocidade do progenitor, era hoje um incorruptível defensor da necessidade de legislar contra a exploração da mão-de-obra infantil.
Tinha uma fisionomia de toupeira, com influências judaizantes, uma daquelas caras que irritam e convidam à desconfiança. O ar de manga-de-alpaca, desconfiado e antipático por excelência, herdara-o de um avô materno, que tinha tido fama de onzeneiro e de cobrar juros de 200% ao mês para os empréstimos que fazia às gentes desesperadas que a ele recorriam em última instância, quando viam esgotados todos os caminhos que a imaginação e as limitações de então colocavam à sua disposição. Este avô materno, o Mão de Gancho, como era conhecido na aldeia, tinha aliás casado aos 42 anos com uma moça vinte e quatro anos mais nova por motivos que se prendiam com uma cobrança de juros que a família dela não podia pagar, tendo-se servido da pobre moça como último recurso para liquidar a dívida, facto que não lhe servira de grande coisa, porque a mulher, que possuía um feitio que não era para brincadeiras, logo tratou de o meter com dono e enfiar-se debaixo de quantos ela quis que lhe passassem por cima, que aliás foi a aldeia quase em peso. Contava-se aliás à boca pequena que as duas filhas do casamento nada teriam que ver com as diligências matrimonias do tal de Gancho, de tal maneira que todos os homens da aldeia as tratavam por filhas e desconfiavam da paternidade lhes pertencer a ponto de lhes terem recusado pretendentes com os respectivos filhos quando atingiram a idade casadoira por temerem vir dali relação incestuosa, o que obrigou as pequenas a terem de encontrar a sua sorte fora dos limites territoriais, coisa em que, diga-se de passagem, toda a aldeia se esforçou diligentemente. A mais velha acabou por ir parar a Porto de Mós, atracada ao filho de um comerciante de tecidos por atacado que andava de terra em terra e que pareceu a toda a gente moço respeitável e com futuro no negócio paterno; à mais moça, a mãe do nosso Antonino, fora encontrado um pretendente num dos primos afastados do padrinho de baptismo, que na altura se encontrava já lançado num pequeno comércio na vila mais próxima, com boas perspectivas de prosperidade. Este aspecto fora aliás ponto de honra de toda a aldeia, pelo menos dos seus elementos masculinos, que haviam acabado por convencer as respectivas mulheres a envolverem-se no bom sucesso do empreendimento.
Foi eleito cabeça de lista pelo partido no distrito de Évora, e então resolveu enviar uma carta aos eleitores. Qual não foi porém o seu azar ao ter visto a carta escarrapachada num semanário nacional, enviada por um professor de português, em que apareciam corrigidos 17 erros ortográficos, 23 erros de acentuação e 25 de pontuação. E a encarnado, porque o jornal se deu ao trabalho de publicar a cópia da carta a cores. O que ao certo não se sabe muito bem se terá influenciado o voto dos seus correlegionários, insensíveis que por hábito säo os portugueses a estas coisas da correcção na escrita, embora por outro lado barafustem por tudo e por nada com os desgraçados dos professores e com os órgäos de comunicação social; ao que se saiba, também não foram encontradas estatísticas sobre a influência dos professores de português no resultado da votação.
segunda-feira, dezembro 13, 2004
O que acontece quando as coisas desaparecem
Abriu e fechou a gaveta, depois a outra por baixo daquela, o armário ao lado, o frigorífico, a arca congeladora, o forno do fogão a gás, o microondas, onde raio é que o teria metido? Ele há dias assim, uma pessoa perde uma coisa e depois anda à procura pela casa inteira e nada, até parece que a coisa perdida fica para ali escondida a rir a bandeiras despregadas, eu sei que estás à minha procura e eu aqui tão bem escondida, a olhar para ti e tu ceguinho de todo, não é hoje que vais dar comigo, e se calhar amanhã muito menos, hei-de dar contigo em maluco durante uma semana, ou mais, até desistires ou dares comigo por mero acaso.
Certo, certo, é que aquilo lhe fazia falta, muita falta mesmo, e sentia a angústia subir-lhe aos ouvidos, pô-los a chiar, até os olhos já não conseguirem ver nada de nada, nem com óculos nem sem óculos, diabos levassem a vida, a casa, a empregada, a mulher, os dois pirralhos que tinha lá em casa e que às vezes se divertiam a esconder-lhe as coisas, o cão, isto sem falar na sogra que, dia sim, dia sim, se metia em arrumações porque achava que a casa estava sempre num pandemónio, e então quando se metia no escritório e começava a tirar os livros todos e a colocá-los nas estantes por ordem de tamanhos, então era um vê se te avias, ele nunca mais dava com nada, mas ela achava que assim é que estava bem, onde é que se tinha visto livros pequeninos misturados com livros grandes, aquilo até era um atentado à sensibilidade estética fosse de quem fosse, a dela principalmente, que era a que mais importava, e de nada lhe valia dizer-lhe que os tamanhos dos livros não podiam de modo nenhum servir de orientação para a maneira como estavam arrumados. Depois era uma semana inteira a meter aquilo tudo na ordem outra vez, sem tempo para fazer mais nada, após o que lá vinha novamente a sogra inexorável e o seu sentido estético e lhe punha tudo do avesso, andavam sempre nesta roda-viva, e se fechava a porta à chave ela lá arranjava maneira de a abrir, uma vez até tinha chamado um serralheiro quando ele não estava em casa e mandara-o arrombar a fechadura, instalar uma nova, escondendo depois a chave para ele não dar com ela e lhe fechar outra vez a porta.Agora nem conseguia encontrar as coisas mais simples, uma caixa de fósforos, o estojo dos óculos, o telemóvel, o comando da televisão, as chaves do carro, a carteira, e começara a deixar tudo enfiado nos bolsos das calças ou do casaco, ao menos aí estava livre da sogra, da empregada, dos filhos, da mulher, do cão, só lhe faltava qualquer dia lembrarem-se de lhe porem os bolsos em ordem, o pior era quando tinha de mudar de calças ou de casaco e deixava as coisas cá fora, de noite estavam lá e de manhã nem vê-las, sumiam misteriosamente, estava mesmo a ver que qualquer dia tinha de contratar um bruxo qualquer para lhe meter um feitiço na casa, nos bolsos, nos seus objectos pessoais, ou então montar uma ratoeira em todos os buracos da roupa para apanhar quem lá lhe metesse a mão, arranjar uma armadilha ou um cofre-forte para meter lá as coisas, pode ser que assim a coisa se resolvesse, embora tivesse as suas dúvidas. E o cúmulo era o raio do animal, que volta e meia ainda por cima lhe ia às calças e lhas roía todas, roubava-lhe as coisas dos bolsos e então adeus, era uma vez o que quer que fosse que lá estivesse.
O pior, o pior de tudo mesmo, era sentir que a coisa estava lá escondida, a olhar para ele e a rir-se à sucapa, que é o que as coisas desaparecidas fazem.
domingo, dezembro 12, 2004
Mais estofos de gatos
Uma história triste
Na esquina de baixo do bairro havia um tipo de aspecto algo duvidoso, que era conhecido como o «Mãozinhas». Dizia-se que era traficante de droga, com especialidade na liamba, que isto de vender droga também tem as suas particularidades e dá direito a especialização e tudo.
Já ninguém se lembrava como o «Mãozinhas» tinha ganho aquela alcunha. Uns que era por causa da tendência de fazer mão baixa a tudo o que andava ao seu alcance, outros que era por causa dumas histórias antigas que metiam ligeireza de mãos com a segunda mulher do senhor Joaquim, proprietário de uma mercearia de porta aberta desde a altura da construção do bairro e ainda hoje estabelecimento de referência para a freguesia mais idosa, que a mais nova preferia o hipermercado do centro comercial do bairro vizinho.
Sabia-se, contudo, que o «Mãozinhas» acabara por constituir família com a viúva do sacristão da igreja lá do sítio, fizera-lhe dois filhos a somar aos outros dois que a dita senhora trazia já do anterior casamento, e a negociata sustentava aquela gente toda e ainda dera para pagar o internamento da mãe da viúva num lar de terceira idade que pertencia a uns indianos que o exploravam há cerca de cinco anos, após uma aquisição com sucesso a duas irmãs solteironas que haviam acabado por adquirir uma casinha na Praia da Areia Branca com o dinheiro dos indianos.
Quando a polícia (que de vez em quando dá um arzinho da sua graça) deitou a mão ao «Mãozinhas», a família toda entrou em greve de fome à porta do Governo Civil e ali foi definhando dia após dia dentro de um carro abandonado até ao dia do julgamento sem que qualquer alma bondosa lhes passasse cartão. A pobre da mulher lá ia conseguindo umas bolachas e uns sumos de quando em vez logo que decidiram que isto de greves era chão que não dava uvas nenhumas e ao fim de seis meses juntou-se-lhes a mãe, que no lar não davam esmolas a quem não pagava as mensalidades. A velha morreu ali mesmo, e levou acompanhamento da bebé mais nova, após um surto de bexigas e sarampo que varreu a criançada toda. Deitaram as mortas no meio da rua, e passaram três dias a gemer e a tiritar de frio e de fome até que houve quem, na Segurança Social, se lembrasse de que uma velha e uma criança mortas no meio do passeio fariam uma bela figura na abertura dos telejornais e nas parangonas dos diários e não dariam lá muito boa imagem de um país da União Europeia; por fim lá levaram os cadáveres para lhes darem destino. Agarraram depois nas outras crianças e enfiaram-nas em dois lares. A mulher hoje ainda lá está, dentro da sucata abandonada, e quem por lá passa pode ouvir umas toadas tristes e desesperadas que lhe saem pela boca fora.
quarta-feira, dezembro 08, 2004
Síntese nº 1
Um dia passa a correr
Dois dias assim-assim.
Já não sei o que querer
Já não tenho mão em mim.
segunda-feira, dezembro 06, 2004
Sortes

Quando o corcunda descobriu que tinha uma bossa nas costas, achou que mais valia aproveitar-se do que andar por aí a lamentar-se e a chorar pelos cantos. Vai daí deixava as moças passaram-lhe a mão pela dita (ao que diziam, dava sorte) e ele lá lhes ia passando as suas por onde calhava, umas vezes mais acima outras mais abaixo, um vê se te avias. Mais ou menos mão aqui e acolá, um dia acabou por dar de caras com uma rapariga que engraçou com ele. Casaram de capela e tudo, música a preceito, convidados enfarpelados, até um bispozito para lhes cantar a missinha, que o homem era dado a conhecimentos na diocese.
O pior é que a mulher era ciumenta com aquilo das costas e já não deixava que experimentassem a mãozinha da sorte. Estava convencida de que, se se desse a tais licenças, a fortuna havia de ir mirrando aos poucos e poucos, e ficava sem nada para si. E mais ainda: estava plenamente convicta que, esfregando a coisa todos os dias, mais cedo ou mais tarde ganhava o totoloto ou coisa que lhe valesse, despachava o homem com um dose de pesticida no arrozito do jantar e embarcava prás Antilhas, pró Brasil, São Tomé, um desses destinos de turistas que tivesse calor, praias e criados à ordem. Já tinha tirado o passaporte e volta e meia passava pela calada pelas agências de viagens e ia recolhendo uns folhetozitos que guardava com todo o cuidado nas gavetas da cómoda.
Mas um dia o caldo entornou-se quando, numas festas por altura da sexta-feira santa, deu de caras com o tal de bispo todo abraçado ao marido na sacristia da igreja a afagar-lhe a bossa nua e crua. Afinou, chamou todos os nomes que conhecia ao corcunda e ao bispo (outros até os inventou na altura), fez um escarcéu na igreja, a tal ponto que a missa das sete teve que ser anulada e as portas da igreja encerradas enquanto o bispo encetava uma retirada estratégica pelas traseiras.O corcunda é que não achou piada nenhuma ao exagero da mulher, meteu-a na rua e contratou um advogado (que fora seu padrinho de crisma) para meter os papéis do divórcio. Deixou a pobre da desgraçada sem nada, até conseguiu uma pensão devido à deficiência, e abalou para as Canárias. Ao que parece, vive hoje amancebado com um inglês reformado numa casa com piscina, court de ténis e cavalos. Continua a receber religiosamente a sua pensãozita todos os meses.
domingo, dezembro 05, 2004
História de sucesso
Quando a mulher entrou em parafuso, comprou um carro novo e desandou. Calcorreou Alentejo abaixo e acima, meteu-se pelas Beiras e acabou enfiado na Galiza. À laia de compensação, comprou um cachorro e passaram a meter conversa com ele sempre que saía à rua com a cão à mija da ordem. Água vai, água vem, meteram-se na cama dele p’ra cima de duzentas galegas, umas mais baixas outras menos, até que começou a fazer selecção por alturas: não valiam mais de metro e setenta nem menos de metro e sessenta. Andava com um metro no bolso, desses de carpinteiro, que têm uma língua de dois metros e meio, e fez umas marcas na soleira da porta, que era para não se dar a enganos. A coisa resultou durante uns meses, até que as tipas começaram a dar com aquele mania e a acharem-no meio esquisito. Foi nessa altura que arranjou uma cadela para fazer companhia ao cão. Mandava-os à rua e às compras na mercearia do dom Agustín sozinhos (levou um tempinho a ensinar-lhes o truque) e deixava-se ficar para ali deitado na cama ou no sofá a ler jornais e a coleccionar os suplementos. Organizava-os em pilhas por assuntos e entretinha-se a meter-lhes umas capas artísticas que fabricava com cartão prensado, tecidos de cortinados e tintas acrílicas. Um dia a mulher que lhe fazia a limpeza gabou-lhe os dotes artísticos e levou uns quantos volumes de oferta. Ela pespegou-os na lojeca da nora. Aparentemente fizeram sucesso.
Hoje o homem é milionário e tem umas fábricas de encadernações de luxo que exporta para os States e a América Latina. Entretanto os cães multiplicaram-se e moram todos lá em casa. Os pais, os filhotes, os netitos e mais um ou outro rafeiro que arrepanhou das ruas. Parece que são felizes.
sexta-feira, dezembro 03, 2004
A Lamia
"She was a gordian shape of dazzling hue,
Vermilion-spotted, golden, green, and blue;
Striped like a zebra, freckled like a pard,
Eyed like a peacock, and all crimson barr'd;
And full of silver moons, that, as she breathed,
Dissolv'd, or brighter shone, or interwreathed
Their lustres with the gloomier tapestries-
So rainbow-sided, touch'd with miseries,
She seem'd, at once, some penanced lady elf,
Some demon's mistress, or the demon's self.
Upon her crest she wore a wannish fire
Sprinkled with stars, like Ariadne's tiar:
Her head was serpent, but ah, bitter-sweet!
She had a woman's mouth with all its pearls complete:
And for her eyes: what could such eyes do there
But weep, and weep, that they were born so fair?"
John Keats, excerto de «Lamia»
quinta-feira, dezembro 02, 2004
Coisas visuais
Vamos todos pra Belém

Agora já anda tudo contente com as eleições à vista. Como se já não bastassem as que já estavam previstas, ainda vai haver mais. Boa. Vamos andar numa roda viva.
O homem lá disse que já não queria este governo, e pronto. Primeiro disse que sim, agora já diz que não. E é isto coerência. Afinal o brinquedo avariou-se depois de quatro mesitos e agora já não presta? Ou foram os comprimidos de ferro que souberam a amargo?
E é isto a tal de democracia que se apregoa pelos mercados fora, com empurrões à mistura e tudo.
Lá vão mais uns subsidiozinhos para os partidos, mais uns dinheiritos para aqui e acolá, uns cartazezitos, uns autocolantes, que as gráficas também têm direito à vida. Mais umas pancaditas nas costas, mais uns xoxos à direita e à esquerda, uns passinhos de dança com o rancho folclórico e pronto. Anda tudo mais alegre. Se calhar o tal de Jerónimo até já sorri...
Será que vão socratizar a populaça portuguesa? Vamos lá ver se afinal não nos servem mas é um calicezinho de cicuta no final disto tudo.
