U
ma das maiores controvérsias a que assisti nestes últimos tempos, e na qual acabei por meter a minha colherada, discorreu a propósito de um problema de identidades relacionado com uma avantajada senhora, momentaneamente vizinha de piscina do grupo a que eu pertencia, e a quem uns iluminados progenitores decidiram chamar Preciosa, nome que esteve na origem da tal troca de opiniões e deste improviso, já que houve quem tivesse ouvido tratá-la por Graciosa a um anafado miúdo com mais tendência para leão marinho do que para primata, que fazia esparrinhar litros e litros de água por todos os lados sempre que decidia atirar-se de qualquer maneira para dentro de água, dúvida que se manteve ao longo de toda a tarde e do serão, gerando alguns equívocos que na altura nos pareceram relevantes para traçar um retrato psicológico da pessoa em questão, a quem certamente não faltariam preciosidades de carácter, muito embora não fossem notórios ao grupo de observadores que constituíamos, podendo contudo dar-se o caso de ser a nossa atenção que pecava por escassa, já que muito menos nos foi possível descortinar a graciosidade da referida figura, e ainda menos notá-la nalguns aspectos da conversa que ia mantendo com a tal foca humana e com a sua companheira de cadeira, o que não quer, de modo algum, dizer que o nosso tempo tivesse sido totalmente preenchido na observação fenomenológica do problema, Preciosa ou Graciosa era a questão, tendo daí surgido uma complicada problemática face à impossibilidade de chegarmos à verdade, a qual poderia ostentar diversas formas, que é o que frequentemente acontece à verdade, está uma pessoa convencida de qualquer coisa e às tantas por tantas dá por si envolvida num equívoco, apesar de por vezes ser difícil demonstrar o contrário, já que as demonstrações também podem estar na origem de novos lapsos, propositados ou não, geram grandes burburinhos, discussões, insultos, velados ou não, zangas, bofetada para cá, bofetada para lá, acabando tudo numa enorme confusão sem que se levante a menor pontinha do véu, mas uma coisa eu posso afiançar, fosse o nome da dita cuja este ou aquele, pelo menos não aparentava nem um nem outro, e até hoje fiquei na dúvida.