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  • domingo, novembro 20, 2005

    Vozes


    O

    inesperado aconteceu, que nunca lhe passara pela cabeça ser possível, muito menos digno sequer de alguma vez o imaginar, impensável, calculou, de todo em todo incrível, que é o que se diz das coisas em que não se consegue crer nem com todas as fés neste mundo e no outro, quando menos estava à espera, no quarto de dormir rodeado de estantes e de livros, começou por ouvir um zumbido no silêncio da noite, tão leve que pensou ser qualquer problema nos ouvidos, uma otite que o atacava inesperadamente, um motor qualquer lá fora na escuridão da rua, qualquer objecto mecânico que desatara de súbito a dar acordo de si às tantas da madrugada, uma dessas geringonças electrónicas que qualquer miúdo da vizinhança com problemas de insónia decidisse pôr a funcionar sem sequer pensar nos que ali por perto pretendiam dormir em tranquilidade, mas depressa percebeu que aquele ténue sibilo logo se transformou em murmúrio, como se mil e uma vozes decidissem, de um momento para o outro, entrar em mútuas confidências, e ele ali no meio, a ter que assumir o papel de confessor de sabe-se lá que mistérios inconfessáveis, mas pouco depois descobriu que aqueles sussurros provinham dos livros, das dezenas de obras que se empilhavam pelas prateleiras em aparente desalinho, nas mais diversas línguas e nos mais diferentes tons, uns mais alvoroçados que outros, aqui e além uma súplica, ali ao lado uma veemente reprimenda, mais abaixo um exaltado diálogo, em cima um apaixonado intercâmbio de inquebrantáveis promessas, por detrás algum desencontrado monólogo lírico, mais à frente um qualquer dogma defendido com desenvoltura, num discurso firme e recheado de convicção, e foi quando percebeu, finalmente, que os livros falavam, que lhe dirigiam as palavras encerradas nas suas capas dobradas, nas suas páginas e páginas de papel e tinta, como se quisessem, todos e cada um, assumir o protagonismo e ter o monopólio da sua atenção, num bulício crescente, nas mais diversas línguas, aqui e além conseguia até discernir uma toada melancólica de quem apenas enumera palavras e nomes por ordem alfabética, deviam ser os dicionários, pensou, os de línguas, os de autores, os corográficos, os de história, os disto e daquilo que se arrumavam mais ou menos num ajuntamento de que pretendiam sobressair, as gramáticas azamboavam-lhe os ouvidos com regras atrás de regras num desregramento dissonante, uma vez por outra chegavam-lhe gritos desesperados, apelos impetuosos, vozes atrás de vozes, masculinas, femininas, infantis, outras de difícil qualificação, criando-lhe no cérebro um vórtice de desvario que já quase nem o deixava pensar, incapaz de fazer um movimento, de se levantar da cama e de sair dali, de abandonar aqueles apelos egoístas, que dele exigiam uma individualizada atenção, um pequeno gesto que os tirasse da imobilidade a que, em muitos casos, há anos estavam entregues, mas a custo lá conseguiu içar-se, abrir a porta e fugir, fugir mesmo, seminu, para o meio da rua, onde o encontraram no dia seguinte, encostado a uma árvore, enregelado e enlouquecido, a murmurar um discurso interminável e sem nexo nas mais diversas línguas e tons.

    Posted by: Rezendes / domingo, novembro 20, 2005
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