Há coisas ainda piores do que os responsos a Santo António, que são as cartas em cadeia (nem sei bem se é assim que se denomina tal coisa) a prometer uma catadupa de maldições, maus olhados e azares de todos os géneros e feitios a quem se atrevesse a quebrar a corrente, como a maldição de que me lembro de tempos recuados, chuva, nevoeiro e tempestades, feitiço de Cleópatra, e nunca percebi para que tais coisas serviam, deve ser da minha ingenuidade congénita, só pode ser isso, mas houve quem se tivesse infelizmente lembrado de me enviar um questionário de cadeia, desses inventados por um sádico qualquer para atazanar os amigos e mais tarde infectar uma data de desprevenidos como eu, um senhor que, além de vir cá a casa abarbatar-se com as vitualhas que lhe ofereço de quando em vez, ainda por cima depois me apresenta a conta sob a forma de perguntas. Só podia ser coisa de advogado...
Não podendo sair do Fahrenheit 451, que livro quererias ser?
Poderia alegremente dizer um livro de cheques, mas como hoje em dia uma tal coisa já peca por vetustez, pelo menos para o comum dos cidadãos, e cheques carecas são o que mais abunda por aí, resolvendo desde já precaver-me contra investigações judiciárias, prisões preventivas, penas suspensas e sei lá mais que sarilhos, e ainda por cima porque este negócio me foi passado por um advogado, sendo por isso devido algum respeito ao cumprimento da lei, poderia muito calmamente enveredar por uma das minhas manias e dizer que era A Balada do Mar Salgado do Hugo Pratt, mas como não deve ser nada fácil decorar texto e desenhos, ainda para mais com o jeito que tenho, o melhor será ficar-me mesmo pelas letras, e referir o Peregrinatio Ad Loca Infecta, de Jorge de Sena, que lugares nauseabundos é o que mais começo a encontrar sempre que me dá na gana meter-me por aqui e por ali.
Já alguma vez ficaste apanhadinho por uma personagem de ficção?
Pelo anjo da Barbarella quando li a história e vi o filme, que me meteu cá uma inveja na altura que nem vos digo nem vos conto, isto para calar bem caladinho alguns outros momentos em que fiquei verde e não foi por ser sportinguista nem nada que se parecesse, mas houve mais tarde alguns personagens masculinos dos livros do Henry Miller que me deixaram ainda mais de cara à banda, vai-se a ver e é algum tipo de defeito ou tara, e se não for é mesmo cá uns formigueiros que nos atacam assim de repente quando uma pessoa vai passando os olhos por estes livros ou por aqueles, ele há coisas que de vez em quando nos passam pela vista que nos deixam um bocado atordoados, já fiquei assim por diversas vezes, já, sim senhor, umas mais, outras menos. Mas também não me importava nada de passar por Corto Maltese...
Qual foi o último livro que compraste?
...xa cá ver, acho que foram três, em simultâneo, quatro, se contar uns dias antes, por isso não vou fazer discriminações, e paguei-os com cartão multibanco, que é coisa que dá bastante jeito para uma pessoa não andar por aí com a carteira cheia de dinheiro que ainda se arrisca a levar uma traulitada e a ficar sem nada, e se apresenta queixa depois ainda vêm juízes e advogados, para já não dizer polícias, acusarem uma pessoa de andar com dinheiro, mas para que é que o senhor queria andar com dinheiro na carteira?, estava-se mesmo a ver que andava a pedir que o roubassem, nunca ouviu falar em cartões de débito ou de crédito?, se bem que há que se entretenha na mesma a pedir emprestados os cartões e os respectivos códigos, mas esses livros não foram roubados nem nada, que não se fique com a ideia de que ando a roubar livros nas livrarias nem seja onde for, passo a nomeá-los, de João Aguiar, O Jardim das Delícias, Edições Asa, Porto, 2005, ISBN 972-41-4144-6, para que fique aqui a informação completa (está-me a parecer que isto é uma sondagem patrocinada pelas editoras em vésperas de feira do livro), João Miguel Fernandes Jorge, Castelos I a XXXV, Averno, sem lugar de edição, 2004, sem ISBN (para minha grande tristeza), de Maria José Guerreiro Duarte, As Armadilhas da Paixão, Vega, Lisboa, 2005, ISBN 972-699-761-5, Umberto Eco, A Misteriosa Chama da Rainha Loana, Difel, Miraflores, 2005, ISBN 972-29-0732-8, ou não fosse eu um maníaco dos quadradinhos por a obra conter algumas referências (e ilustrações) sobre o assunto. Ah, ia-me esquecendo do volume 16 dos Spirit Archives, da Will Eisner, publicado pela DC. Era grave!
Qual foi o último livro que leste?
De Martin Amis, O Cão Amarelo, Teorema, Lisboa, 2004, ISBN 972-695-596-3, por ser um autor de que gosto e que já traduzi para português, para ver se a tradução estava bem feita (isto é subterfúgio, bem sei), e de facto não estava, se bem que não é fácil traduzi-lo, mesmo nada fácil, mas podia estar bem melhor, não gostei de certas expressões, que não são nada naturais na língua portuguesa, nota-se o esforço mas não chega, enfim, é uma opinião, mas achei a obra menos interessante do que outras que já li do mesmo autor.
Que livros estás a ler?
Só faltava, já agora, virem vasculhar-me as prateleiras, os livros que tenho empilhados na mesa de cabeceira, depois abrirem as gavetas para ver se há alguma coisa inconfessável escondida lá dentro, não querem lá ver...
Como costumo ler mais do que um livro ao mesmo tempo, aproveito aqui para avisar que sou fã de quadradinhos (ainda não tinha dito isto em lado nenhum, pois não?), e que normalmente deito mão a isto e aquilo (para ler ou reler), por isso ando a ler o volume 4 da (re)edição da DC Archives de The Plastic Man, de Jack Cole (estou à espera do volume 16 de Spirit Archives, de Will Eisner, já adquirido a Tales of Wonder pela Internet), vou aí pela página 50, mais coisa menos coisa, de As Armadilhas da Paixão, de Maria José Guerreiro Duarte, Vega, Lisboa, 2005, ISBN 972-699-761-5, e ainda vou lendo uns capítulos da História da Lisboa de Dejanirah Couto, Gótica, Lisboa, 2004, ISBN 972-792-046-2. Entretanto, já depois de ter escrito estas linhas, mas ainda antes de ter colocado o post, chegou o tal volume 16 dos Spirit Archives, de Will Eisner, editado pela DC e adquirido à Tales of Wonder, a que vou deitar a mão já hoje.
Que livros (5) levarias para uma ilha deserta?
Em primeiro lugar, se me esquecesse dos óculos bem que podia dispensar os livros, que sem eles nem me valia de nada ter lá a Biblioteca do Congresso à disposição, sem eles é que nada feito, nada de nada, mas se ao menos tivesse essa lembrança podia então exercer alguma selectividade. Para ler e reler sempre, a referida Peregrinatio Ad Loca Infecta, de Jorge de Sena, isto se não pudesse levar a Obra Completa, pelo menos um dos volumes, que ao menos sempre tinha mais leitura, depois A Balada do Mar Salgado do Hugo Pratt, a Poesia do Século XX editada pelo Jorge de Sena, Ficções do Jorge Luís Borges (aqui hesito entre este e o Livro de Areia, se bem que podia também levar o volume 1 das Obras Completas, que ainda por cima tem O Aleph e a História Universal da Infâmia), e ainda me falta um, se fiz bem as contas, que podia ser uma edição das Páginas Amarelas, não é que me servisse de muito (a leitura sempre entretinha), mas quando acabasse o papel higiénico podia dar bastante jeito.
A quem vais passar este testemunho (três pessoas) e porquê?
A quem podemos chatear com um questionário deste género? Eis uma boa pergunta. Como já não posso reenviá-lo ao senhor que me veio desassossegar o juízo, irei enviá-lo a pessoas que não conheço pessoalmente, excepto no primeiro caso, e assim já não me podem bater, nem vir fazer manifestações aqui à minha porta, nem muito menos furar-me os pneus do carro, que serão: a LolaViola, para se entreter a responder a perguntas parvas e para ver se ao menos mete um post novo, que anda um tudo-nada preguiçosa ultimamente, à Estounua, do Vareta, para poder ao menos rogar-me uma maldição e porque vou mexericar nas suas leituras :-) , além do facto de, tal como a Lola, conhecer pessoalmente o senhor que me enviou isto e a quem encomendo um bom raspanete, para já não falar numa coça das antigas da próxima vez que se encontrarem, e ainda ao Vizinho porque não o conheço, mas é sportinguista como eu e porque, como gosta de motos, bem como o senhor que me enviou esta joça, pode ser que um dia destes se encontrem por aí os dois e cheguem a algum entendimento acerca deste desporto, cujo objectivo eu nunca percebi.