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  • quarta-feira, março 16, 2005

    Figuras tradicionais 2: o amolador


    D

    e tempos a tempos, ainda há coisa de poucos anos, ouvia-se um longo e persistente trinado que, aos poucos e poucos, se ia aproximando, até se conseguir distinguir uma escala de sons que se repetia em tom crescente e depois decrescente, e que à gente mais velha dava imediatamente para dizer olha, vem aí chuva, o que era normalmente quase tão certo quanto a morte e aos impostos, que, como dizem, nunca falham, nem há memória que tenham alguma vez falhado.

    E, logo que esse trinado se interrompia, ouvia-se uma palavra que ecoava pela praça, amoladooooooor, aparecendo então a figura que arrastava à sua frente um carrinho de mão cheio de chapéus de chuva pendurados, e de outros instrumentos que manejava com uma eficácia de meter inveja, ao ponto de trazer a criançada embasbacada com a facilidade com que voltava a dar utilidade a um alguidar rachado, metendo-lhe três ou quatro gatos que faziam da peça partida loiça novamente inteira, que colocava varetas novas nos chapéus de chuva estragados, devolvendo-lhes a dignidade de voltarem a exercer a função da sua razão de existirem, fazendo das facas cegas os instrumentos cortantes que uma vez tinham sido.

    Conheci um homem destes, o senhor Pacheco, galego talvez, como muitos dos que calcorreavam o país de cima a baixo em busca de vida melhor do que a que então levavam na sua Galiza natal, tornando vivas coisas já dadas por mortas, como se alguma magia houvesse naqueles gestos certeiros com que ressuscitava o que sem ele caminharia decerto para um destino incerto, ou porventura mais do que certo, o lixo, com uma paciência que parecia ser inesgotável, com uma fé que tinha por certo o resultado final, a de que as coisas que damos por acabadas no fundo ainda nem viveram metade da vida que lhes deu quem as criou, como se de um médico milagreiro se tratasse, o Sousa Martins do bricabraque, dos potes, dos alguidares, das facas e canivetes, das sombrinhas e do mais que sabia poder consertar, e dado o trabalho por findo, acabando-se-lhe a clientela, lá ia com o seu carrinho de mão, assobiando a melopeia para outro lado, para onde houvesse mais vidas quebradas que, por meia dúzia de tostões, regressassem aos seus normais afazeres domésticos.

    Era homem de poucas palavras, o senhor Pacheco, mas nunca faltava com o bom dia ou boa tarde, e aguardava pacientemente que as clientes fossem surgindo, algumas meio envergonhadas pela necessidade de poupança que declaravam às vizinhas ao levarem-lhe a arranjar os tarecos, um ou outro já remendado em prévias visitas, e pouco troco dava às crianças que se reuniam em seu redor, com aquela curiosidade que as faz atentas a tudo o que de repente lhes altera os pequenos passos que começam a dar pela vida. Um dia o senhor Pacheco deixou de aparecer. Nunca soube o que lhe tinha acontecido, se regressara à sua terra de origem, se morrera, se deixara de trabalhar, e ninguém mais lhe seguiu os passos. Hoje compra-se tudo nos hipermercados e os caixotes de lixo vão cheios de coisas que morrem mais cedo do que deviam.

    Posted by: Rezendes / quarta-feira, março 16, 2005
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