Tive uma colega, aqui há uns bons anos atrás, aparentada com uma bloguista que até costuma deixar aqui uns comentários e de que não vou revelar o nome, que nas suas aulas de Francês se referia a um recurso tecnológico que utilizava de quando em vez como um magnetofone, o que, é bom que se diga, provocava risadas abafadas aos alunos, que se apressavam depois a relatar tão inusitado vocábulo aos outros professores, todos regra geral mais novos do que a referida professora, como se, na verdade, os franceses ainda hoje não utilizassem tal termo para se referirem ao aparelho em vez de mais um termo anglófono, que são já tantos os que vieram descaracterizar a língua francesa, caminho que aliás vimos trilhando por cá desde o século passado e, para além disso, a professora não ia querer um gravador áudio para nada, já que não se tratava de pôr a gravar qualquer conversa fiada de alunos mas de reproduzir excertos falados em francês, para que a garotada ouvisse um registo sonoro em fita magnética e assim pudesse contactar com a língua falada, porque entre nós falar de leitor de cassetes é logo motivo para se pensar em automóveis, e não era nada disso que se tratava, se bem que nos tempos que correm o que mais se vê é leitores de discos compactos ou até de dêvêdês, para os mais finos, ou pelo menos mais endinheirados, isto sem mencionar i-pods ou tecnologias que constituem o último grito nestes negócios da reprodução de bandas sonoras, se bem que a referida colega, não sendo uma exímia condutora, também não era dada a exageros como o de uma outra que conheço, que resolveu, às tantas por tantas, dar banho ao carro no laguito do jardim aqui da freguesia, passando por cima do relvado e das flores e mergulhando de forma intrépida para a lavagem do dito veículo, sem se preocupar com a invasão do domicílio dos patos e gansos que ali andavam e que mais tarde foram desaparecendo aos poucos e poucos por culpa, ao que se dizia, de uns cães vadios que resolveram fazer repasto de tais aves aquáticas, se bem que ficou sempre a desconfiança de o repasto estar mais ligado a humanos do que a canídeos, o que é bem revelador da dissimulação a que se entregam certas pessoas, culpando por tudo e por nada a bicharada alheia das suas próprias fraquezas.
Veio isto a propósito da mania das modernizações lexicais que vou ouvindo e lendo por aí, que às tantas por tantas dou comigo a ler e a ouvir as palavras mais inusitadas que alguma vez surgiram na língua portuguesa do lado de cá do oceano, porque do lado de lá é por demais sabido que abundam aportuguesamentos um tanto ou quanto estranhos mas que cada vez mais se ouve neste nosso Portugal por via da influência de programas de televisão que se tornaram populares desde que um canal do Estado resolveu meter no ar a primeira telenovela brasileira, calculando decerto que desta maneira contribuiria para um mais rápido e eficiente acordo ortográfico de que se fala há anos e anos e que se encontra emperrado por falta de verbas, dizem uns, por ausência de vontade política, dizem outros, pela resistência de alguns velhos do Restelo, avançam ainda uns tantos, porque a gente não precisa de mudar nada que está tudo perfeito assim mesmo como está, rematam os que ainda não se encontravam incluídos nos grupos acima referidos, mas o certo é que houve quem tenha gasto algum do seu tempo a realizar prontuários, gramáticas e dicionários ou quem, por manifesta estultícia, tenha gasto algum do seu dinheiro a comprá-los, que eu cá acho que me incluo neste último grupo, mas também quem me manda ser tolo?